quinta-feira, outubro 21, 2010

DAS DESCULPAS - Amplifique o meu sussurro


Com o lápis roubado de alguém e o pensamento roubado de outros tempos (passado e futuro numa mesma gaveta), eu escrevo. Reporto-me aos tempos que, cansado de ser eu mesmo, desprendi-me procurando o horizonte de outros eus.
Era uma questão de amor: queria amar o entendimento, entender todos (pensantes ou coisas) porque todos eram o que eu era. E eu era a fumaça, a distância, o acostamento, o símbolo do infinito, o número i.
E nessa questão de amar o desprendimento sobraram só as palavras que eram infinitos de sentido muito similar que pulavam de minha mente quando vibravam as cordas vocais, sem pudor nem restrições que é coisa de um ser só quando sabe que é só. Sol só. Só mar.
E de mares e de sois rugia o que chamam desejo. E também só desejava andar com as pernas ou com as rodas de bicicleta. Queria o vento, queria o sol que nasce, queria água potável que era o próton de tudo, queria a fuga do que não se sabe ao certo: talvez rotina ou limite.
E a rotina e o limite poderiam casar-se enquanto substantivos e exercer diversas trocas de posições como fazem alguns casais modernos que ora são adjetivo ora são substantivo que são. Segunda: rotina-limite. Terça: limite-rotina. Quarta: rotina-limite-rotina -----------------------------------------------------------------
Até que chegou o dia da rota-limite, que se tornou rota-limitada, mesmo sentindo a falta do “in” que carregava do meio da segunda sílaba da primeira banda da palavra composta de duas palavras casadas. E o antigo “a” depois do “in” ficava para o vento. Este era um novo “a”.
Letra “a” que tinha meu nome e meu significado.
Mas não penses que tenho saudade, porque se escrevesse do que sinto falta – muito provavelmente – não chegarias nem ao terceiro parágrafo. O que sinto e, portanto, escrevo é respeito.
Respeito minha fuga da qual nunca deixei de fugir. Mas fujo de formas diferentes, cuspindo e escarrando nos obstáculos que cuspiriam e escarrariam se eu tropeçasse – Mas meu tropeço, amigo, é, bem sempre, quase nunca, externo... Assim nem que seja do escarro consigo o direito.
Escarro sim, mas preservo a mão que me afaga mesmo sabendo que é, com as licenças dos Anjos, a primeira que apedreja.
E minha arma é a palavra-proteína que constrói os músculos. Da essência os comando e escrevo a minha arma que está almada e apontada para: o dedo do pé, o sossego, o desapego, a rot(in)a.
E eu protesto, e eu grito, e eu falo do vento, da estrada de terra ou da Avenida Ventura de Farias.
Aponto minha palavra que é arma mas também própria palavra que se completa com o pronunciar-se que é o completar-se do indivíduo. E as linhas brancas gritam. E meu grito é um “beijo elétrico” que sussurra: vamos “mudar o mundo com os lábios”?
(A palavra é a arma e a música é a pronúncia agradável de gatilho).
E assim como “perder-se também é achar-se”, a fuga também é uma volta. Volto para a rotina-limite, ou com as maquiagens que estão em alta: para a (des)rotina-(i)limit(ada) de pensar e existir que vem de lucro.

2 comentários:

Anônimo disse...

Vc não sabe como foi bom me ver afogado de novo no ilimitado sentido das limitadas palavras de um texto.

"Mas não penses que tenho saudade, porque se escrevesse do que sinto falta – muito provavelmente – não chegarias nem ao terceiro parágrafo."

Esse parágrafo destacado soou/suou, sem dúvida, como uma bofetada na cara. HAHAHA

Fico extasiado também quando vc faz esse jogo intertextual, como fez agora com o A. dos Anjos.

Depois disso não tem como não aceitar suas desculpas. HAHAHA =D

Abração, meu velho!!

=*

kelly disse...

fui impregnada pela leitura e
por alguns instantes tive a impressão de estar lendo clarice lispector... vc foi tão intenso qto ela
é um privilégio poder embriagar-me nas entrelinhas desse espetáculo apresentado entre as coxias e o palco

ainda extasiada, permaneço te aplaudindo de pé